Na última semana, um dirigente vascaíno que atua na área de gestão do clube deu uma boa entrevista relatando as perspectivas de recuperação financeira do Vasco.
De imediato, é preciso louvar a posição do dirigente ao afirmar que acredita na recuperação do clube e chegou a estabelecer um prazo de 2 anos para que isso aconteça. Nos últimos anos, o que se tem visto e ouvido de diversos vascaínos da política do clube é um cenário desolador.
O dirigente enumera diversas iniciativas em curso no sentido de equacionar dívidas, diminuir despesas e aumentar receitas. Além disso, cita que está em curso aquisição de ferramentas de gestão e ajustes na estrutura de governança no Vasco. Tais medidas sempre carecerão de análise mais cuidadosa para que se tenha melhor juízo acerca das escolhas feitas. No entanto, consideremos e acreditemos hipoteticamente que bons resultados surgirão em algum momento. Portanto, essa é minha premissa. Consideremos que estejamos avançando. Mas, aonde chegaremos e quando? Vai funcionar e será suficiente no tempo que precisamos?
O futebol vive a maior concentração de recursos em todos os tempos. A Europa domina como nunca antes o futebol mundial. No Velho Continente, a concentração elegeu poucos clubes e mesmo lá, já existe uma grande quantidade de marcas ameaçadas. Neste sentido, O futebol sulamericano é, portanto, um produto periférico e o Vasco está muito mal posicionado nessa fila que já é ruim.
Restam aos clubes brasileiros Jogadores de baixo nível técnico e físico. Restam ao endividado e enfraquecido Vasco os piores destes. E se os patrocinadores reservam aos clubes brasileiros orçamentos menores, imagine o que eles reservam a um clube que foi rebaixado 3 vezes em 10 anos e que vive às voltas com brigas internas.
O Vasco está num ciclo negativo que se realimenta e se enfraquece dos resultados ruins que alcança. É preciso fazer o dever de casa, conforme indica o dirigente vascaíno. Mas somente isso não será suficiente. É preciso agir fora do clube. É preciso aglutinar forças para tentar romper com a lógica vigente. A matriz de poder do futebol já escolheu quem matar. O Vasco está na lista. Tenham certeza disso. Não por raiva, preconceito o direcionamento contra nós. O mercado girou de um modo que atravessa nossa rota de vida. É preciso resistir.
Sorte do Vasco que há outras marcas nisso. Clubes centenários com torcidas numerosas no mundo inteiro. E esses clubes precisam romper com o sistema, antes que percam o que possuem de mais valioso – suas torcidas em razão da escassez de títulos e da irrelevância que vão ganhando. Os clubes mais ricos tendem a ter os ídolos e conquistas. Para quem os filhos e netos desses clubes vão torcer? Para quem torcem hoje os filhos dos Americanos e Banguenses dos anos 70?
É a vida. É o destino que tende a se repetir. O Vasco, o Peñarol, o Valencia, o Botafogo, o Fluminense, o Santos, o Sporting, o PSV, Nápole, Sampdoria, Lazio, Fiorentina e tantos outros precisam reagir enquanto podem. O Vasco mudou o esporte em 1923. Mais do que vencer o racismo, ele criou o profissionalismo no futebol brasileiro. Rompeu com o sistema, alterou as condições de disputa do mercado e usufruiu da vantagem obtida pela coragem e ousadia por mais de 50 anos. Ou faz-se isso novamente, ou perderá sua relevância.
Não vejo iniciativa alguma neste sentido. Além da inércia neste campo de discussão, não há iniciativa alguma para diminuir a dependência dos empresários nos moldes atuais. Faz-se necessário discutir o limite de jogadores estrangeiros nos clubes. Isso é fundamental para equilibrar o jogo e descentralizar investimentos. Internamente, no Brasil, é preciso romper com a lógica instituída pelas Leis Zico e Pelé que fragilizaram os clubes.
A lógica de investimento no futebol brasileiro é no jogador e não no Clube. Empresário investe em atleta em formação. Captura na fonte e estrangula o clube que fica inerte diante desse cenário.
Poderia enumerar ainda dezenas de frentes estratégicas em que se deve atuar. Um clube como o Vasco nasceu para enfrentar grandes adversários. Ele se alimenta da inovação e dos desafios estruturais.
Não vemos isso no Vasco há muitos anos. Se em campo nos acostumamos a rivalizar com os times de menor expressão, fora dele, vivemos dias de mediocridade sem igual.
Um clube e sua torcida se estabelecem numa relação de identidade. Não há identidade alguma entre a torcida e a história recente do clube. O vascaíno não se vê representado e isso é muito grave. Ainda há tempo para se recuperar. Mas é preciso rapidez. É preciso dar um basta ao que existe no futebol mundial e buscar novos parceiros e ambientes. É hora de guerra fora do clube. Chega de divisão interna, pois o adversário é imenso e ligeiro. Mas ainda dá tempo.
Para não ficar apenas nas citações e comentários genéricos. Eu penso que o Vasco deveria iniciar aproximação com clubes brasileiros e sulamericanos para criar novas ligas, discutir a viabilidade de participar de competições alternativas, com base em outras redes de TV e plataformas digitais. Buscar novos cenários e planos de negócio inovadores e estratégicos. Por fim, eu sempre defendi a natureza social do clube, mas esse modelo se esgotou. O Vasco precisa virar empresa e oferecer oportunidade de retorno financeiro com foco em investidores mundiais. Os players que colocam dinheiro no Barcelona, PSG, Milan precisam identificar no Vasco a porta de entrada no mercado sulamericano. Em algum momento, algum clube brasileiro fará isso. Espero que seja o Vasco.
Tudo isso é difícil, soa como sonho, ou afastamento da realidade, mas creia, quando o Vasco decidiu dar um pulo no escuro e sair do campeonato em 1924, todos devem ter pensado o mesmo. E o Vasco revolucionou o esporte e virou o Gigante que essa geração de vascaínos não pode matar.
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